Os vinhos argentinos dos vinhedos do marechal brasileiro

by José Maria Santana | 02/06/2017 14:15

Erika Goulart

Uma paulistana faz sucesso na vinicultura argentina. Erika Goulart, dona da bodega Goulart, com vinhedos em Mendoza, conquistou admiradores em vários países com seus tintos concentrados e finos produzidos, principalmente, com Cabernet Sauvignon e Malbec, provenientes de vinhas velhas. Os vinhos são bons e têm uma história mais interessante ainda.

Erika é neta do marechal paulista Gastão Goulart. Um dia, ao fazer uma busca em antigos papéis deixados pelo avô, teve uma surpresa. Encontrou documentos referentes a uma propriedade vinícola em Mendoza. Descobriu que o marechal era dono de dois vinhedos plantados em 1915 na sub-região de Lujan de Cuyo. Assim ela se tornou produtora de vinhos. Esta semana Érika apresentou seus tintos e brancos em São Paulo, distribuídos por uma importadora também criada por ela, a World Malbec.

O vinhedo Don Pedro, plantado em 1915

Casada com o argentino José Luis Lugilde, Erika pesquisou e desvendou a incrível saga. O então capitão Goulart foi um dos chefes militares da Revolução Constitucionalista de 1932, a rebelião dos paulistas contra o governo provisório de Getúlio Vargas. Comandava a chamada Legião Negra, formada por negros vindos de todas as regiões do Estado. Quando a revolta foi dominada pelas tropas legalistas, o capitão teve o mesmo destino que outros líderes amotinados, o exílio. Foi morar em Buenos Aires com a esposa e em uma de suas viagens pelo país comprou as terras em Mendoza. Alguns anos depois, reabilitado, voltou ao Brasil, prosseguiu a carreira militar, chegou a marechal e morreu em 1959.

O primeiro trabalho foi recuperar a vinha

A família nunca soube de seu interesse pelas vinhas, até que a neta Erika descobriu em 1998 os velhos documentos do avô. No local indicado ela encontrou os dois vinhedos, completamente abandonados, e a propriedade ocupada por invasores. Resolveu ir à luta. Depois de uma batalha de cinco anos na Justiça argentina recuperou a posse das terras e tomou uma decisão que mudou sua vida. Disse ao marido que passaria a cuidar dos vinhedos.

Erika não entendia nada de vinho. Publicitária de formação, era uma bem sucedida empresária, dona de uma produtora de eventos, feiras e exposições em São Paulo. “Eu ganhava muito dinheiro na época”, conta ela, “mas trabalhava demais e não vivia”.

Ao chegar a Mendoza, deparou-se com um mundo novo: “Antes de mais nada, foi uma mudança de vida. O sucesso como produtora de vinhos foi apenas consequência”. A primeira tarefa árdua foi recuperar as quase centenárias parreiras de Malbec, situadas a 950 metros acima do nível do mar. Tinha dois empregados e um trator. Depois contou com o apoio dos sócios da vinícola Alto Las Hormigas – e um deles, o agrônomo Mauricio Parody, tornou-se sócio da nova empresa.

A empresa tem hoje 55 hectares de vinhedos

No início, Erika vendia suas uvas a terceiros. Em 2002, começou a ensaiar produzir seus próprios vinhos. O primeiro rótulo chegou ao mercado em 2005. Na época, ela tinha a assessoria dos respeitados enólogos Pablo e Hector Durigutti. Hoje a Bodega Goulart, que agora pertence apenas a Erika, possui 55 hectares de vinhedos nas zonas de Lunlunta e Barrancas, área de Luján de Cuyo, plantados especialmente com Malbec e Cabernet Sauvignon. Produz 600 mil garrafas por ano. O enólogo atual é José Hidalgo.

Érika tem dois filhos e mora com o marido em Buenos Aires, onde ele é dono de uma loja de antiguidades, a Vetmas. O vinhos, que mantêm viva a memória do avô marechal, são apresentados em diferentes linhas – parte delas distribuída também pela Wine.com.

A vinícola oferece o espumante Goulart Brut Reserve Pino Noir Brut (R$ 72,40). A série Paris Goulart tem um bom branco de Torrontés (com uvas compradas em Salta, no Norte da Argentina) e vários tintos, na faixa de preços entre R$ 44,40 e R$ 69,50. Em um patamar acima estão os tintos das linhas Winemaker’s Reserve (R$ 76,50) e Grand Reserve (R$ 90,80). Nesta última, destaque para o Cabernet Franc 2013 e o Special Blend 2013. Bom também o Goulart M The Marshall Malbec Altura (R$82,65).

No topo ficam os tintos Gran Vin de Goulart, de produção pequena (cerca de 1.200 garrafas cada um) e bem cuidada, com uvas do vinhedo Don Pedro,  plantadas em 1915. Entre eles despontam o Gran Vin de Goulart Old Vines Malbec 2008 e o Blend Old Vines Malbec 2009, corte de 90% Malbec, 6% Cabernet Sauvignon e 4% Cabernet Franc. Segundo a empresa, estes vinhos especiais não serão vendidos separadamente e sim em kits com 6 garrafas, ao preço de R$ 1.900.

 

Goulart Winemaker’s Reserve Cabernet Sauvignon 2014

Bodega Goulart – Mendoza – World Malbec – R$ 75 – Nota 89

Tinto equilibrado e macio, com passagem de oito meses por carvalho francês. Os aromas lembram cacau, baunilha e ameixa. Tem taninos maduros, nada agressivos. Um vinho gostoso de beber (14,5%).

 

Goulart Winemaker’s Grand Reserve Cabernet Franc 2013

Bodega Goulart – Mendoza – World Malbec – R$ 98 – Nota 90

É sempre interessante provar vinhos de Cabernet Franc, quando bem feitos. É o caso deste, a partir de uvas de Lunlunta, com estágio de 12 meses em barricas de carvalho. Ameixa, especiarias e tabaco aparecem ao nariz e também algo de ervas. Na boca mostra bom corpo, é intenso, com bom frescor (14,5%).

 

Goulart Winemaker’s Grand Reserve Special Blend 2013

Bodega Goulart – Mendoza – World Malbec – R$ 98 – Nota 91

Corte de 60% Malbec e 40% Cabernet Sauvignon, com 12 meses de barricas francesas, tem aromas limpos, com toques florais, de especiarias e algum herbáceo, em base frutada a amora. É fino, equilibrado e untuoso, daqueles vinhos aveludados, fáceis (14,5%).

 

 

 

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