A caravana do Alentejo, sempre com bons vinhos

by José Maria Santana | 31/10/2018 11:37

A caravana, em São Paulo

Depois da seca que castigou a região nos últimos anos, os produtores do Alentejo, no sudeste de Portugal, voltaram a ter alívio com a excelente colheita de 2018, que deve dar vinhos bastante equilibrados. Para promover seus tintos e brancos, uma caravana com representantes das vinícolas locais percorreu quatro cidades do Brasil dias atrás. Em São Paulo, o evento, organizado pela Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), aconteceu no dia 15 passado. Boa oportunidade para provar o de melhor se produz por ali.

O Alentejo é uma das zonas vinícolas mais importantes de Portugal, concorrendo à altura com o Douro. É limitada ao norte pelo Tejo, o maior rio português, a leste pela fronteira com a Espanha, ao sul pelas serras do Caldeirão e de Monchique, e a oeste pelo Oceano Atlântico. Com área de 27 mil quilômetros quadrados, é a maior província de Portugal em extensão, ocupando cerca de 30% da superfície total do país. Ainda assim, é a menos habitada, com apenas 5% de sua população. Terra de planície, com algumas pequenas serras, sua paisagem é marcada por campos, pontilhados de árvores.

Alguns dos vinhos da prova

No evento da CVRA em São Paulo, o especialista Alexandre Lalas conduziu masterclass sobre a região e seus vinhos. A área dedicada à plantação de uvas no Alentejo é de 22 mil hectares, correspondendo a 10% dos vinhedos do país. O clima, do tipo mediterrâneo-continental, é muito particular. Seco e bastante quente no verão, frio no inverno.

Lalas observou que na maior parte da província o clima sofre influência dos ventos quentes que sopram da Espanha, originando vinhos mais estruturados e maduros. Mas há zonas onde penetram as brisas frias vindas do Atlântico, especialmente a Vidigueira, onde os vinhos mostram mais frescor. Há também grande diversidade de solos.

O especialista destacou que os vinhos da região podem adotar duas linhas diferentes, a Denominação de Origem Alentejo (DOC Alentejo) ou a Indicação Geográfica (Regional Alentejano), mais ampla. Nos dois casos devem seguir regras e condições rigorosas para serem aprovados pela CVRA. O Vinho Regional Alentejano pode ser produzido em qualquer área da província ou é indicado quando a vinícola pretende ter mais liberdade para experimentação. Já os DOC Alentejo são os vinhos com mais tradição, os clássicos.

Na DOC Alentejo há oito sub-regiões, cada uma com suas peculiaridades. Ao norte a sub-região de Portalegre tem vinhedos plantados em altitudes mais elevadas, protegidos dos ventos pela Serra de São Mamede. Nos solos graníticos, frios, a uva amadurece mais lentamente, proporcionando vinhos elegantes.

As oito sub-regiões

Na parte central há cinco sub-regiões. Borba é uma zona em que a média de chuvas é maior do que no restante da província. Tem mais verde e menos horas de insolação. No solo há grandes manchas de mármore. Vinhos com frescor e elegância. Já Redondo, que recebe ventos quentes da Espanha, mescla vinhos com potência e fineza. O que determina é a exposição do vinhedo à luz solar – a nascente, com menos sol, vinhos mais elegantes; a poente, com maior insolação, vinhos estruturados.

Évora, ao redor da bela cidade de mesmo nome, considerada a capital da província, tem clima continental, quente no verão, rigoroso no inverno, com grande amplitude térmica. Nos solos há presença de quartzo e calcário. Abriga alguns dos vinhos mais prestigiados do Alentejo. Reguengos tem clima quente e solos pedregosos, que absorvem e depois espalham o calor para as plantas.

Completando a área central, Granja-Amareleja, na fronteira espanhola, é sub-região bastante quente, marcada por terrenos planos, com muito xisto, que reflete o calor. Ali as plantas estão sempre em estresse hídrico e dão vinhos muitas vezes rudes e com maior gradação alcoólica.

Ao sul, a Vidigueira apresenta clima especial, quente, mas temperado pelas brisas frias vindas do mar. Seus melhores vinhos oferecem frescor e elegância. Por fim há a sub-região de Moura, quente, com solos mais pesados, de calcário e argila, que ajuda a reter a água. Produz vinhos estruturados e alcoólicos, menos rudes que os de Granja-Amareleja.

As uvas adotadas nos vinhos do Alentejo são as tradicionais portuguesas, com algum tempero de castas internacionais. Entre as brancas, predominam Antão Vaz, Arinto e Roupeiro. Na ala tinta, que compõe a ampla maioria dos vinhedos, a receita básica se sustenta no tripé local Aragonês, Trincadeira e Alicante Bouschet. Nos últimos anos também ganharam algum espaço a Touriga Nacional, a Castelão e a Alfrocheiro. Cabernet Sauvigon e Syrah completam o encepamento.

De modo geral, os vinhos do Alentejo ganharam fama pela percepção do consumidor de que ficam prontos a beber mais cedo, sem taninos agressivos. Isso é proporcionado pelas boas condições de amadurecimento das uvas e pelos cuidados com a vinificação. Utilizando recursos da Comunidade Europeia, as vinícolas alentejanas incorporaram tecnologia moderna antes que os produtores de outras regiões portuguesas.

Selecionamos alguns tintos colocados em prova, que dão um panorama do que se faz na região. Alguns vêm de casas conhecidas, mas também há novidades que vale muito provar.

 

EA Tinto 2016

Cartuxa/Fundação Eugênio de Almeida – Alentejo – Portugal – Adega Alentejana – R$ 88,10 – Nota 89

A Fundação Eugénio de Almeida é um dos grandes nomes do Alentejo. Sua adega da Cartuxa, na Quinta de Valbom, em Évora, ocupa um edifício histórico de 1580, que pertenceu aos jesuítas. Neste tinto jovial, da gama média da casa, o enólogo Pedro Baptista mescla Aragonês, Trincadeira, Alicante Bouschet, Syrah e Castelão. Traz ao nariz notas florais, algo vegetal e de framboesa. Classificado como Vinho Regional Alentejano, é frutado, macio, redondo, com estrutura. Está no ponto e é fácil de beber (13,5%).

 

Dona Maria Tinto 2015

Dona Maria/Júlio Bastos – Alentejo – Portugal – PPS – R$ 135 – Nota 90

A magnífica Quinta Dona Maria, do início do século XVIII, situa-se na cidade de Estremoz, sub-região de Borba. Diz-se que na época foi comprada por Dom João V para presentear a amante, Dona Maria, que deu nome à propriedade. Ali se produz bom vinho há mais de 150 anos. A quinta pertence desde 1988 a Júlio Bastos, mas só em 2003 ele começou a tocar projeto próprio, os vinhos Dona Maria, depois de sair de uma sociedade com os franceses dos Domaines Barons de Rothschild (Lafite). Seu tinto é identificado como Vinho Regional Alentejano. Lote de 50% Aragonês, 20% Cabernet Sauvignon, 15% Alicante Bouschet e 15% Syrah, estagiou por 6 meses em barricas usadas de carvalho francês (60%) e americano (40%). Lembra nos aromas ameixa e frutas de bosque, em meio a notas de cedro e tostados. Na boca tem bom corpo, é estruturado, redondo, macio, com elegância e frescor final, estilo que marca os vinhos de Júlio Bastos (14,5%).

 

Folha do Meio Colheita 2015

Terrenus Veritae – Alentejo – Portugal – All Confiance – R$ 120 – Nota 91

A empresa Terrenus Veritae surgiu em 2009 na sub-região de Portalegre, um ano depois de colher suas primeiras uvas em uma vinha antiga plantada dentro do Parque Natural da Serra de São Mamede, a uma altitude que varia entre os 500 m e os 550 m, em terreno xistoso. Seu tinto, apresentado como Vinho Regional Alentejano, parte de Trincadeira, Alicante Bouschet e Aragonês, com estágio de 12 meses em carvalho. Nos aromas há notas de cacau, cassis e tabaco. Mostra bom corpo, taninos maduros, acidez fina e frescor final (14%).

 

Art.Terra Amphora Tinto 2017

Casa Agrícola Alexandre Relvas/Herdade de São Miguel – Alentejo – Portugal – Cantu – R$ 182 – Nota 92

Vem da zona de Redondo, junto às encostas da Serra D’Ossa, mas aqui o produtor optou por classificar como Vinho Regional Alentejano, para ter mais liberdade na vinificação. Lote de Aragonês, Moreto e Trincadeira, é fermentado em talhas de barro, com leveduras indígenas, onde permanece em repouso com as borras por 3 meses. Traz ao nariz notas florais, terrosas, de alcaçuz e de fruta a cereja e amora. Na boca também mostra muita fruta madura, limpa, em um conjunto delicado e elegante, com estrutura e muito boa acidez. Ao final nota-se leve vinagrinho e um toque de resina proveniente da talha (13,5%).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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