Nicolás Catena relança o icônico Malbec Argentino com novo rótulo e composição

by José Maria Santana | 12/12/2018 11:18

Catena, no evento de São Paulo

Nicolás Catena Zapata, o grande nome do vinho da Argentina, apresentou em novembro em São Paulo a safra 2015 de seu icônico tinto Malbec Argentino, um monumento de equilíbrio e fineza. No evento organizado pela importadora Mistral, de Ciro Lilla, Catena disse que se trata de um relançamento, pois o vinho está agora com novo rótulo e as uvas utilizadas em sua composição vêm de vinhedos diferentes daqueles presentes nas versões anteriores. Só uma coisa não mudou: a qualidade.

Desde o lançamento original, com o vinho da safra de 2005, até a edição de 2013, as uvas incorporadas ao Malbec Argentino vinham de dois importantes vinhedos da empresa: Nicasia, de 1996, localizado em Altamira, no distrito de La Consulta, vale de Uco, a sudoeste de Mendoza, a 1.095 m acima do nível do mar; e Adrianna, plantado por Nicolás Catena nas alturas de Gualtallary, no vale de Uco, em Mendoza, uma espécie de Grand Cru sul-americano. Na colheita de 2015 a composição mudou. As uvas selecionadas para o tinto passam a vir do Nicasia e do histórico vinhedo Angelica, plantado em 1930 em Lunlunta, Maipú, no Alto rio Mendoza, zona de clima mais seco e quente, a 920 metros de altitude. O nome é homenagem à mãe de Catena.

O novo rótulo do Malbec Argentino

Já o novo rótulo é muito expressivo, uma verdadeira obra de arte na linha do realismo fantástico. O desenho traz quatro figuras femininas que representam a secular história da Malbec, casta originária da França e emblemática atualmente na Argentina e na Catena Zapata. A primeira mulher retratada é Eleonor de Aquitânia, que viveu no século XII na região de Bordeaux, terra da Malbec, e foi rainha da França e da Inglaterra.

A segunda é Ana Moscena, que imigrou da Itália para a Argentina e se casou com Nicola Catena, também imigrante italiano e avô do atual proprietário. Eles plantaram a primeira vinha de Malbec em 1902 em Mendoza e deram início à vinícola da família. A terceira figura, desenhada como se fosse a morte, lembra a filoxera, a praga que dizimou os vinhedos europeus no século XIX. Por fim, a quarta mulher é Adrianna Catena, filha mais nova de Nicolás Catena, que simboliza a Bodega Catena Zapata e o renascimento da Malbec no Novo Mundo. O design foi desenvolvido pela empresa especializada Stranger & Stranger, que tem escritórios em Londres e nos EUA, com desenho de Rick Shaefer.

 

Catena e a Malbec

A uva Malbec de grãos pequenos

Curiosamente, a Malbec não foi a primeira escolha de Nicolás Catena quando se colocou o desafio de produzir na Argentina um vinho à altura dos melhores do mundo. Entusiasmado com o que vira no Napa Valley, na época em que morou na Califórnia no início dos anos 1980, convidado a dar aulas de Economia como professor visitante na Universidade de Berkeley, ao voltar à empresa da família ele procurou inicialmente produzir um branco de Chardonnay e um tinto de Cabernet Sauvignon de alta gama.

A Malbec era a preferida do pai, Domingo, que insistia para ele também apostar na variedade. Outro fato contribuiu para isso. Em 1990, Nicolás contratou como consultor o enólogo norte-americano Paul Hobbs – que havia trabalhado para Robert Mondavi na Califórnia e participado da criação do super tinto Opus One – para reforçar a equipe técnica da casa, então chefiada por José ‘Pepe’ Galante. Hobbs ajudou inicialmente a moldar para a Catena Zapata um grande branco de Chardonnay e depois começou a atuar nos tintos, primeiro Cabernet Sauvignon.

Ele lembrou certa vez que Nicolás não estava muito convencido do potencial da Malbec, até que um acaso o fez mudar de ideia. “Um francês chamado Sig Moreau – contou Hobbs – me pediu para fazer consultoria para uma vinícola do Chile. A empresa dele queria introduzir o carvalho americano naquele país e para isso, pretendia fazer uma degustação às cegas, comparando os vinhos da vinícola chilena com os de quatro ou cinco outros produtores. No Chile nós envelhecemos Cabernet Sauvignon nos barris e eu perguntei ao Sig Moreau se poderia utilizar também um Malbec da Argentina. Faça o que você quiser, ele respondeu”.

“Então nós envelhecemos Malbec nos barris de carvalho americano”, prosseguiu Hobbs. “Quando Nicolás Catena experimentou esse vinho, ficou surpreso ao ver como era bom. Ficou realmente impressionado com a qualidade. E aí passou a acreditar na variedade. Ele tinha excelentes vinhedos de Malbec em Lunlunta, por exemplo. Em toda a extensão do Rio Mendonza o solo é perfeito para a Malbec”.

Depois de analisar por cinco anos todas as parcelas do velho vinhedo Angelica, Nicolás escolheu as melhores e em 1994 decidiu lançar o Catena Malbec, logo um sucesso, bastante elogiado, por exemplo, por Robert Parker. Pela primeira vez a Malbec argentina foi reconhecida como casta de qualidade internacional.

 

Vinhedos nas alturas

Vinhedos nas alturas, para fugir do calor

Mas ele ainda queria mais. Laura Catena, filha mais velha de Nicolás e hoje à frente da vinícola da família, conta em seu livro “Oro en los Viñedos” que por 10 anos o pai pesquisou intensamente os terrenos de Mendoza tentando encontrar um local em condições de cultivar as uvas para os vinhos especiais que tinha em mente. Também viajou pelo mundo, em busca de informações.

“Em Bordeaux – escreve Laura – ele conheceu um produtor francês que lhe disse, depois de provar um Cabernet Sauvignon da área tradicional de Mendoza, que lhe lembrava um vinho de zona quente e que não teria nenhum potencial de envelhecimento”.

Como fugir do calor e do clima seco de Mendoza? No vizinho Chile, por exemplo, muitos vales sofrem a influência das brisas frias dos Andes e, do outro lado do país, daquelas trazidas pelas águas frias do oceano Pacífico. Mas o que fazer em Mendoza, cujo clima tem características de deserto e o índice pluviométrico médio muitas vezes não passa de 150 mm ao ano? Nicolás Catena intuiu que a solução estava em plantar vinhas em terrenos de grande altitude, mais frios, o que todos diziam ser uma loucura.

Encontrou em Galtallary, zona de Tupungato, no vale de Uco, ao sul de Mendoza, um lugar tão frio e árido a quase 1.500 metros acima do nível do mar, que o próprio encarregado dos vinhedos da empresa condenava, achando que a vide nunca amadureceria ali. Nicolás foi em frente e em 1992 mandou plantar ali o que é hoje o vinhedo Adrianna, nome de sua filha caçula. Ali o clima é frio, mas protegido das geadas indesejadas pelas montanhas que o rodeiam.

No vinhedo Adrianna foram plantadas Chardonnay, Cabernet Sauvignon e Malbec. Em relação a esta última, houve um desafio extra. Como na Argentina não existia nenhuma seleção clonal de Malbec, Nicolás importou clones de Cahors, a terra natal da variedade, na França. Os resultados foram desanimadores, dando cachos de grãos muito grandes, com aromas e sabores rústicos.

Como se sabe, ao longo do tempo houve três tipos diferentes de Malbec – com bagos grandes, bagos médios e com bagos pequenos. A Malbec de grãos pequenos é a que foi trazida para a Argentina no século XIX. Desapareceu da França depois da filoxera. Hoje em Cahors só se encontra Malbec de bagos grandes.

Nicolás decidiu então trabalhar com a prata da casa. Em 1995, promoveu a primeira seleção massal e clonal de Malbec na Argentina, a partir da parcela 18 do vinhedo Angelica, que tem quase 90 anos. Chegou a 135 clones, dos quais foram escolhidos os cinco melhores, os que davam grãos menores, rendimentos balanceados e os sabores mais interessantes. Os chamados “Catena cuttings” foram plantados em diferentes altitudes e microclimas do vale de Uco e hoje integram todos os Malbec da vinícola.

 

Acidez e equilíbrio

No alto, mais intensidade luminosa

As experiências de Nicolás Catena mostraram que, a cada 100 metros de elevação, diminui 1º C a temperatura média no período da colheita, o que é importante em zonas quentes. Nas alturas, também é maior a amplitude térmica, a diferença de temperatura entre o dia e a noite, que favorece a maturação dos cachos e agrega fineza.

Ao mesmo tempo, nas alturas aumentam as radiações de intensidade luminosa. Os componentes fenólicos, antocianas e taninos são produzidos em quantidade superior. E os tintos elaborados com estas uvas têm mais componentes, taninos maduros, quase doces e harmônicos. Ganham em complexidade e elegância.

No caso da Malbec, os tintos das altitudes elevadas ainda se apresentam com maior concentração e amargor menor. Mostram ainda melhor acidez do que os vinhos provenientes de zonas mais baixas. O clima frio favorece o amadurecimento mais lento e pleno das uvas e lhes permite preservar seus ácidos e manter os açúcares em equilíbrio.

 

Os vinhos

Com a Malbec, a vinícola Catena Zapata produz rótulos de diferentes categorias, desde o bom Catena Malbec; ao Angelica Malbec; aos tintos da linha Catena Appellation, de vários vinhedos (Lunlunta, La Consulta, Vista Flores e Paraje Altamira); até os exemplares de gama superior Catena Alta, DV Catena Malbec, Adrianna Vineyard River Stones Malbec, Nicasia Vineyard e o Malbec Argentino. A variedade predomina também, com mais de 95% do corte, no Adriana Vineyard Fortuna Terrae e no raro e estupendo Catena Zapata Adrianna Mundus Bacillus Terrae.

 

Catena Zapata Malbec Argentino 2015

Catena Zapata – Mendoza – Argentina – Mistral – US$ 199.50 (em promoção na importadora por R$ 722 até o final de Dezembro) – Nota 94

Tinto de nível superior, expressão do que de melhor a Malbec pode alcançar na Argentina, à altura dos grandes vinhos do mundo. Vem de parcelas muito antigas dos vinhedos Nicasia e Angelica, selecionadas e vinificadas separadamente pelos enólogos Alejandro Vigil e Ernesto “Nasti” Bajda. Nicasia, situado em Altamira, La Consulta, vale de Uco, com solo argiloso, marcado por pedras redondas, leva o nome da avó de Nicolás Catena Zapata. Angelica, homenagem à mãe de Nicolás, em Lunlunta, a 920 m de altitude, tem quase 90 anos de idade e grande equilíbrio natural trazido pela idade. O tinto foi fermentado em barris novos de carvalho, nos quais 20% dos cachos foram colocados inteiros e permaneceram por 30 dias, para a integração entre madeira e fruta. Depois, foi afinado por 18 meses também em barricas de carvalho francês. Complexo, fino, combina intensidade com elegância. Nos aromas há notas florais, de tabaco, especiarias e algo mineral, em meio a fruta madura, como cereja e cassis. Untuoso, concentrado, tem taninos maduros, boa acidez e frescor. É vigoroso e muito expressivo na boca. Delicioso agora, tem muita vida pela frente (14,1%).

 

 

 

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