Douro tem vinhos com mais frescor

Douro tem vinhos com mais frescor
Douro Vargelas

O vale do rio Douro e suas vinhas maravilhosas

Os vinhos produzidos no vale do rio Douro, noroeste de Portugal, surpreendem sempre pela qualidade e consistência. Antes se destacavam pela potência e força. Agora apresentam cada vez mais frescor e fineza. A Região Demarcada mais antiga do mundo mostra que não está acomodada. A trajetória iniciada com o fenômeno do Vinho do Porto segue com os tintos e brancos de mesa de alta gama, elaborados basicamente com as mesmas uvas, e que já estão entre os melhores do mundo.

Portugal também investe para promover suas maravilhas junto ao consumidor brasileiro. Esta semana, o bem sucedido evento Porto & Douro Wine Tasting revelou ao público do Rio de Janeiro e de São Paulo o que de melhor a região oferece. No total, 39 casas vinícolas participaram da feira, organizada pelo IVDP, o Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, e produzida pela empresa portuguesa Essência do Vinho.

Vinha Maria Teresa 2

Vinhas também para vinhos de mesa

O Vinho do Porto sempre foi o porta-estandarte da região, mas nos últimos anos novas gerações de produtores e enólogos colocaram os vinhos de mesa no mesmo patamar de qualidade. Como se sabe, o Porto é um vinho fortificado, em que a adição de aguardente vínica interrompe a fermentação, deixando açúcar residual e elevando a gradação alcoólica. Já os vinhos de mesa são tintos e brancos em que a fermentação vai até o fim, como ocorre nos vinhos normais.

Assim, a Região Demarcada do Douro, criada em 10 de setembro de 1756, representa hoje oficialmente duas Denominações de Origem: Porto, para vinhos fortificados, e Douro, exclusiva para vinhos de mesa. A área produtora começa 96 km a leste da cidade do Porto e estende-se até a divisa com a Espanha, acompanhando os vales do rio Douro e de seus afluentes. Divide-se em três zonas – Baixo Corgo, Cima Corgo e Douro Superior, já em direção à fronteira espanhola.

Douro 1

A bela paisagem é considerada Patrimônio Mundial

É uma das paisagens vínícolas mais bonitas do planeta, considerada pela Unesco desde 2001 Patrimônio Mundial. Mas foi conquistada à natureza pelo esforço do homem duriense. O vale do Douro é montanhoso. O solo é formado em sua maior parte por placas de xisto. Para plantar, os viticultores precisaram quebrar as pedras a mão, formando os socalcos. Depois vieram patamares pouco mais largos e, mais recentemente, as fileiras verticais, as vinhas ao alto. O estresse parece dar mais energia às videiras, forçadas a aprofundar suas raízes nas fissuras da rocha, em busca de água e nutrientes.

 

Condições diferentes

Desta vez, vamos voltar a atenção mais para os vinhos de mesa, abrigados na DOC Douro. A primeira iniciativa de peso surgiu em 1952 com o tinto Barca Velha, ícone da Casa Ferreira (hoje Grupo Sogrape), criação do genial Fernando Nicolau de Almeida. Para ele, não seria possível que as mesmas uvas utilizadas para Porto não dessem igualmente um grande tinto.

Crasto vinha velha

As vinhas velhas são valorizadas até hoje

A região tem dezenas de uvas nativas, brancas e tintas, com enorme potencial. As vinhas antigas, muito valorizadas até hoje, eram plantadas com diferentes castas misturadas, de modo que não se sabia distinguir umas das outras. Nas últimas décadas foram feitos estudos para verificar quais as cepas tintas que mais se adaptam ao clima e solo durienses e se chegou à conclusão de que as melhores são a Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinto Cão, Tinta Roriz e Tinta Barroca.

Pensava-se que depois do sucesso do Barca Velha outros produtores iriam pelo mesmo caminho, o que não aconteceu. Há alguns anos, Miguel Champalimaud apresentou os bons vinhos da Quinta do Cotto, especialmente o Grande Escolha. Mais recentemente, produtores especializados em Porto fizeram experiências bem sucedidas nesta área, como o Duas Quintas, da casa Ramos Pinto, o tinto Reserva da Quinta de la Rosa ou o Chryseia, que a família Symington, dona da Graham’s e de outras marcas, produz em sociedade com o francês Bruno Pratts.

Niepoort Vinha

Vinhedo da Nipoort, para vinhos de mesa

Mas em nenhum desses casos os vinhos de mesa são o centro do negócio. A mudança começou principalmente nos anos 1990. Um dos pioneiros foi Dirk Niepoort, herdeiro e enólogo da casa que leva seu nome de família. Ele influenciou um grupo de amigos a perseguir tintos e brancos estruturados e equilibrados. Foi a origem dos chamados Douro Boys. Eles estão em plena atividade, acompanhados já por uma segunda geração de jovens talentosos. Eles trocaram o conforto das cidades pela vida rústica nas quintas. Juntos, conseguiram colocar os vinhos do Douro no ranking dos grandes do mundo.

De modo geral, a nova geração acha que a legislação em vigor protege o Vinho do Porto e, de certo modo, prejudica o vinho de mesa. Isso porque existe a chamada “regra do benefício”, pela qual cada produtor recebe um certificado que lhe dá o direito de vender 40% de suas uvas para a elaboração de Porto. A grande preocupação dos agricultores é preencher esta cota, pois a uva destinada ao vinho fortificado é mais valorizada que os cachos endereçados para os tintos e brancos de mesa – a relação chega a ser de 9 para 1! Ainda assim, os jovens produtores apostam no vinho de mesa.

 

Douro socalcos

A vinha se estende da beira do rio até a encosta

Condições

O clima do vale do Douro é agreste, hostil mesmo, com invernos frios e verões extremamente quentes. A colheita começa em meados de agosto e se estende até outubro. No ano passado, por exemplo, a vindima registrou dias de canícula, em que a temperatura beirou os 49º C. O solo pedregoso, de xisto, faz aumentar a sensação térmica. Estas características resultam em uvas adequadas para a produção de Porto: cachos bem maduros, com alta quantidade de açúcar e de álcool potencial, bagos com boa carga de cor e taninos.

A vinha se estende das margens dos rios até 600 m ou 700 m de altitude. Para Porto, são apreciadas as áreas mais baixas e quentes. Já para a elaboração de tintos e brancos de mesa as condições ideais seriam outras. Os enólogos buscam vinhedos mais altos, zonas com maior umidade ou solos graníticos, tudo para conseguir tintos e brancos equilibrados, com fineza e mais frescor.

No evento Porto & Douro Wine Tasting foi possível provar vinhos que exprimem os variados estilos dos vinhos de mesa da região. Vamos apresentar aqui cinco deles. O branco Vallado Reserva trabalha bem madeira e fruta. Entre os tintos, o Vale D. Maria Vinha do Rio é equilibrado e robusto; o Poças Reserva mostra perfil moderno; no Batuta, Dirk Niepoort busca o frescor à exaustão; e o Crochet parece uma mescla de todos, unindo força e fineza.

 

Estilos de vinho

Vallado BrancoVallado Reserva Branco 2014

Quinta do Vallado – Douro – Portugal – PPS Importadora – R$ 236 – Nota 93

A histórica vinícola, ainda em mãos de descendentes da lendária Dª Antónia Adelaide Ferreira, reúne como ninguém tradição e modernidade. Seu branco mescla Arinto, Gouveio, Viosinho e Rabigato. Fermenta em barricas de 500 litros de carvalho francês, onde permanece por seis meses em contato com as borras. Madeira e fruta estão bem integradas. Seco, cítrico, estruturado, envolvente, tem textura macia, acidez viva, equilíbrio, um gostoso toque mineral e elegância. Complexo nos aromas e na boca, mostra que mesmo uma região quente pode oferecer brancos com fineza e frescor.

 

Vale Da. Maria Vinha do RioVale Dª Maria Vinha do Rio Tinto 2014

Quinta Vale Da. Maria – Douro – Portugal – World Wine – Nota 93

Cristiano van Zeller realizou um belo trabalho ao assumir em 1996 a Quinta Vale D. Maria, pertencente à família de sua mulher, Joana. A propriedade muito antiga, situada no vale do Rio Torto, então com 19 hectares, sendo 10 ha. de vinhas velhas, estava arrendada e descuidada. Depois da recuperação, Cristiano passou a produzir tintos magníficos, com sua pequena equipe, que inclui a talentosa enóloga Sandra Tavares da Silva. Possui hoje 28 ha., dos quais 14 ha. de vinhas com mais de 60 anos e 9 ha. com vinhas de 25 anos. O delicioso tinto Vinha do Rio vem de uma parcela especial das vinhas velhas, que ganhou o nome por estar mais perto do rio Torto e em menor altitude do que o restante do vinhedo. As uvas são pisadas em lagar de pedra e o vinho estagia por 21 meses no carvalho francês. Tinto vigoroso, denso, de cor rubi escuro, com aromas de ameixa, em meio a notas florais, de tabaco, especiarias e algo de chocolate. Na boca é encorpado, estruturado, com taninos maduros e muito equilíbrio. Gostoso, carnudo, aveludado, mostra estilo de vinho de zona quente, mas não entrega a gradação alcoólica (15,4%). A produção é reduzida, de apenas 900 garrafas.

 

Poças ReservaPoças Reserva Tinto 2014

Poças Júnior – Douro – Portugal – Cantu – R$ 180 – Nota 90

Em 2014 a tradicional casa Poças, uma das poucas empresas do Porto em mãos de uma família portuguesa, começou bem sucedida parceria para vinhos de mesa da DOC Douro com o enólogo Hubert de Bouard, do celebrado Château Angelus, de Saint Emilion, Bordeaux. A equipe francesa vai cinco ou seis vezes por ano ao Douro e acompanha todo o trabalho, da vinha à adega. O trabalho teve início exatamente com este Reserva Tinto, cujas uvas saem da Quinta de Santa Bárbara, propriedade da família na zona da Ervadosa do Douro, no final do Cima Corgo. Elaborado com Touriga Nacional e lote de vinhas velhas, com idades entre 40 e 60 anos, amadureceu por 12 meses em barricas de carvalho francês novo. Frutado, com toque floral, de tabaco e alcaçuz, é macio, não muito encorpado e elegante (14%).

 

BatutaBatuta Tinto 2014

Niepoort – Douro – Portugal – Mistral – US$ 199.50 – Nota 93

Alegre, nada pesado, obra de arte de Dirk Niepoort, diferente de outros tintos da região e produzido apenas em anos especiais. As uvas vêm das vinhas velhas que a família Niepoort possui no Douro, na Quinta do Carril (mais de 70 anos) e junto à Quinta de Nápoles (100 anos), com rigorosa seleção de cachos. Repousa por cerca de 20 meses no carvalho francês. Nariz rico, mescla de cereja e cassis, com notas florais, de cacau, anis e fina mineralidade. É mais leve que a média dos tintos do Douro, com menos extração, mas mostra complexidade, equilíbrio, elegância e, principalmente, frescor. Madeira e fruta não brigam, ao contrário, estão muito bem balanceadas. Sedoso, está ótimo para beber já e tem muito potencial de guarda (12,5%).

 

Crochet 2Crochet Tinto 2013

Esteban & Tavares – Douro – Portugal – Adega Alentejana – R$ 485 – Nota 93

O Crochet do rótulo brinca com o fato de o vinho ser feito a quatro mãos por duas amigas, as enólogas Susana Esteban e Sandra Tavares da Silva. A espanhola Susana trabalha hoje no Alentejo, mas conheceu Sandra quando atuava no Douro. Elegante, macio, o tinto parte de 60% Touriga Franca e 40% Touriga Nacional, com repouso por 18 meses em barricas de carvalho francês (40% novas). Cereja, ameixa, especiarias e tabaco aparecem ao nariz. Tem bom corpo, taninos polidos, boa acidez e frescor final. Une com perfeição força e elegância, um meio termo entre tintos robustos e vinhos que, embora tenham estrutura, são mais delicados. Um primor (14,5%).

 


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